Nas semanas anteriores falamos muito sobre comunicação e agora vamos entender como ela se relaciona com a noção de violência.
O que é violência para você?
Quando eu falo a palavra “violência”, qual é a primeira coisa que surge na sua mente? Em geral, as pessoas atribuem à ideia de violência imagens como atentados terroristas, guerras, conflitos armados, assaltos etc. De fato, esses são exemplos fortes que cabem perfeitamente dentro desse conjunto. Mas será que é apenas isso? E mais: será que a violência surge apenas em grandes proporções como essas citadas? Ou ela emerge em um crescente que se inicia com gestos sutis do dia a dia?
As pequenas violências cotidianas
Quando falamos sobre comunicação, vimos que nós, enquanto seres humanos, somos sociais em nossa essência. Não somos capazes de viver em total isolamento porque tudo aquilo que todas as habilidades que aprendemos para a nossa sobrevivência são apreendidas pelo contato com o outro. Assim, descobrimos como falar, comer, andar e, também, reproduzir comportamentos. É aí que começa essa história de comunicação não-violenta, porque Marshall Rosenberg, estudioso e criador do termo e da teoria, acredita que nós somos sensíveis em nossa essência e que a violência dos nossos hábitos é adquirida por reprodução de determinados padrões.
Nesse momento, eu gostaria que você fizesse um exercício. Tente se lembrar da primeira vez em que alguém gritou com você. Talvez não seja possível – provavelmente você era muito pequeno -, mas tente chegar à primeira memória possível. Agora, busque lembrar a sensação que isso provocou em você. Como você se sentiu?
Com essa memória ainda viva dentro de você, vamos caminhar mais um pouco.
É muito comum que esses primeiros gritos sejam ouvidos ainda na primeira infância como forma de represália a alguma atitude inadequada (e cabe aqui destacar que TODAS as crianças cometem atos ditos “inadequados” porque ainda não foram devidamente socializadas. Por isso, seguem seus instintos e desejos sem a preocupação com o que é certo e errado. Cabe sim aos adultos ensinar essas noções às crianças, mas isso não deve envolver atitudes violentas). A grande questão é que o “grito” provoca uma sensação de medo, mas não resolve a questão. Muitas pessoas, ao acessarem essa primeira memória, lembram do grito e da sensação, mas não do motivo pelo qual aquilo aconteceu. Por isso, além de traumática, essa postura é pouco eficaz porque não ensina, não explica a razão pela qual algo deve ou não deve ser feito.
Só que esse grito ensina um determinado padrão de comportamento que, comumente, volta a aparecer quando ocupamos a outra posição de uma relação hierárquica: a autoridade.
Quantas pessoas (ou até mesmo você) tentam conquistar o respeito através do grito?
E como isso se aplica no dia a dia?
Bom, antes de tudo, é importante entender que a história do grito é apenas um dos exemplos de como a violência está impregnada em nosso cotidiano e como, muitas vezes, ela passa despercebida. Hoje, no entanto, já é possível identificar e abordar melhor esse assunto. Você já reparou, por exemplo, no aumento expressivo de pessoas falando sobre relacionamento abusivo? Pouco tempo atrás, essa expressão sequer existia.
Rosenberg nos mostra que a CNV é a chave para desenvolver relações mais maduras e (melhor ainda) alcançar resultados positivos na hora da comunicação. Vejamos então algumas dicas:
> Escuta ativa:
Reflita: quando alguém fala, você se coloca 100% dedicado à escuta? Ou fica pensando no que responder?
O primeiro passo para estabelecer uma comunicação não-violenta é desenvolver uma escuta ativa, ou seja, ouvir com atenção aquilo que está sendo dito para você. Em seguida, tente lembrar de tudo o que foi dito, só assim você poderá dar o melhor feedback para a pessoa.
Um ponto importante aqui é saber que aquilo que foi dito não necessariamente corresponde ao que você entendeu. Isso porque as pessoas possuem formas distintas de se comunicar o que, geralmente, provoca ruídos. Então, em lugar de dizer “você disse isso”, diga “eu ouvi/entendi você dizer isso”. Assim, além de tirar a frase de um lugar acusatório, você consegue esclarecer possíveis falhas na comunicação.
> Empatia, honestidade e respeito:
Abra mão de uma postura sisuda. Colocar-se de rosto fechado ou em posição de “ataque” também são formas de violência. Da mesma forma, evite os joguinhos: não diga algo contrário ao que realmente deseja dizer, não faça provocações ou indiretas. Em lugar disso, opte por uma postura honesta e sincera dentro do diálogo. Lembre-se: diante de você está uma pessoa que também possui sentimentos e fragilidades.
Essa parece ser uma dica difícil de ser cumprida, pois, como já estamos muito envolvidos (e acostumados) com relações violentas, temos uma tendência à desconfiança. Mas pense comigo: a única forma disso mudar é se cada um de nós fizer a sua parte.
> Seja claro:
Verifique se a outra pessoa compreendeu de fato o que foi dito. Faça isso de maneira respeitosa, sem ares de cobrança. Isso evitará refações e desconfortos.
> Saia da posição de acusação:
Mesmo que você tenha razão, ok? Digamos que você se ofendeu com algo que foi dito: é fundamental que essa situação se resolva e que tudo seja esclarecido para que a relação volte ao padrão harmônico. No entanto, se você chegar acusando o outro (“Você me fez grosseria!”), a tendência é que a situação se agrave e caia no lugar da briga. Por isso, Rosenberg nos diz para trazer a fala para o nosso ponto de vista, colocando as nossas emoções no lugar da ação do outro. Assim, diga: eu me senti desrespeitado pela sua fala, eu me senti magoado com o que você disse; eu compreendi isso a partir do que você falou etc.
Isso vai abrir a possibilidade do diálogo e do entendimento, o que é justamente o que queremos em relações saudáveis.
Que tal começar hoje a aplicar essas ideias no seu dia a dia e ver os resultados que elas podem trazer?